A pedra de sal

Roberto Kusterle – L’uomo e la Terra

A vida é boa. Aham, sei. Boa para quem? A vida é uma inconstante pedra de sal travosa que engolimos todos os dias. A morte deve ser pior, mas isso só saberei depois. Entretanto, não me venha com essa autoajuda ou essa esperança de livros em promoção. Daqueles que a capa tem sempre uma imagem bonita, uma mão pronta a segurar a sua. A vida é esta velha pedra de sal se derretendo e subindo a sua pressão. A velha pedra de sal lambida pelo gado, pelas ovelhas e amarelada pela poeira depois da chuva. Desafio os que abdiquem deste sabor marrento, desafio o homem, qualquer que seja, a ser o espírito santo.

Então se a coisa é por aí, não me tente dizer o contrário. Falava com uma amiga que atravessa um caos em sua vida, um câncer, mas não disse a ela que tudo vai ficar bem. Disse a ela que tudo é inconstante e qualquer palavra estava nela mesma, qualquer possibilidade de resposta. É assim que faço comigo. Eu sei o que me dizer, embora abdique disso quando acho necessário. Faço isso porque não existe uma resposta. Não existe uma certeza, nem para o homem nem para a capa do livro. Tudo está acontecendo sempre e, por isso, não existe circunstância mais certa do que a pedra de sal.

Tudo aqui anda tão sujo, bem mais sujo que o velho curral, disse o cantor há quatro décadas. E o que mudou desde então? Modernizaram os currais e os cochos, virou cibernético, digital, mas continua sendo o mesmo antro. O mesmo esterco é depositado, o mesmo esterco.

Não sei se você reparou, mas sempre que encontramos alguém somos obrigados a falar sobre isso. A falar sobre a vida, a meditar, a acreditar; somos obrigados a nos vestir de uma esperança passageira e desnecessária. Nem tente, disse o escritor que vomitava sobre si mesmo. Nem tente mesmo, porque depois do portão tem um vagabundo pronto para lhe assaltar e você não pode se defender, a menos que queira ser chamado de vagabundo. Bandido. É simples ser bandido neste país, difícil é ser cidadão.

Agora, pense direito e reflita sobre o que pensa em me dizer em seguida. Pense no seu espelho e me diga se sua língua não está amarga e rasurada pela velha pedra de sal.

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