A intolerante interpretação da tragédia


Desde a morte de Eduardo Campos naquele trágico acidente, ando estarrecido. Primeiro foi o choque, depois o resultado da repercussão. O presidenciável pediu para não desistirmos do Brasil, mas parece que o povo não entendeu o que ele queria com isso e, motivados por uma mídia fascista e irresponsável, vem inflamando um ódio de proporções nazistas. Pela primeira vez em 12 anos de profissão, penso em abandonar o jornalismo, mas aí eu estaria desistindo do Brasil. Por isso, me chamo à responsabilidade dessas linhas que serão lidas por pouquíssimos, talvez por ninguém além de mim.

Desde a morte de Eduardo Campos um povo desinteressado de melhorar o Brasil procura um culpado para a fatalidade. De tanto assistir a filmes estadunidenses e de ver países como estes construírem guerras, esses poucos querem supor a possibilidade um atentado terrorista, se sequer entender disso ou compreender o espaço político em que Campos estava inserido. O homem que trabalhava pelo centrismo jamais imaginaria ouvir ou ler o que escuto e leio hoje. A cada postagem sobre a morte, o sepultamento, a dor da família, aparece um radical apontando a presidenta Dilma Rousseff como responsável pela morte do ex-governador.

Queria acreditar que essas pessoas eram desprovidas de educação e cultura, mas sofro justamente pelo contrário, uma vez que ainda neste tempo do milênio, são as pessoas com poder aquisitivo maior e que tiveram acesso a algum tipo de educação que se colocam como formadores de opinião nas redes. Entretanto, noto a manipulação rasteira incutida nos principais veículos de comunicação produzida por profissionais de minha formação. Um jornalista mal-intencionado ou mal orientado é tão perigoso quanto um médico que se recusa a atender a uma grávida em trabalho de parto; quanto um político que não investe em educação para bancar sua campanha ou um pai que deixa o filho brincar com um leão só para fazer um filmezinho para as redes sociais.

Provavelmente, alguém já está se beneficiando da desgraça. O próprio PSB que vê a possibilidade de Marina Silva alavancar na campanha; a própria mulher de Campos que chegou a ser colocada como vice de Marina, embora não possa. Mas eles são políticos e isso faz parte do processo. Eduardo incentivaria isso, não pela espetacularização, mas pelo compromisso de não desistir do Brasil. Como defensor do governo Lula/Dilma poderia dizer que Aécio se beneficia do trágico, mas seria uma insensibilidade drástica de minha parte imaginar que a reação do ex-senador não é real. Eu que nunca vi Campos sinto uma dor aguda, que dirá ele que convivia e que o tinha como adversário na disputa, talvez não justas, mas sempre muito saudável e democrática como é a política brasileira.

Dilma e Lula conviveram com Eduardo Campos a vida toda. Estavam adversários talvez até o final do primeiro turno. Como adversários eles disputam, mas num país feliz como o nosso, a amizade e o respeito não morrem por isso. Se Aécio e eu estamos abalados, Dilma e Lula devem estar destruídos, não porque são mais sensíveis que nós, mas porque conviveram mais com ele.

É comum nos tempos de campanha haver discordâncias e acusações, mas tudo tem um limite. As pessoas no Brasil precisam aprender que não se pode ir a uma rede social acusar alguém de terrorismo e ficar por isso mesmo. Precisam entender que a palavra tem força e que um conjunto de pensamentos negativos faz surgir movimentos perigosos como foram o fascismo e o nazismo. Neste ano, o povo foi aludido a isso e ganhou as ruas, mas sem um propósito, as manifestações acabaram revelando as más intenções midiáticas e políticas de uns poucos. Não podemos desistir do Brasil, concordo com Campos, mas não podemos esperar apenas pelos políticos ou acreditar que uma mão invisível vai resolver nossos problemas.

Somos uma nação em construção e todo esforço positivo é necessário, o contrário, é trazer de volta um passado velho e sombrio ou atrair uma cultura de ódio e de guerra que destrói hospitais e mata crianças sem propósito algum.

Comentários

  1. Perfeito seu texto meu amigo ... Como sempre "coerência" é primordial, bom seria se todos , ou no mínimo, os que tiveram formação para isso, a utilizassem ...

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