Sobre a liberdade e a mentira


“O homem está condenado a ser livre”. Esta premissa de Sartre tem me levado a pensar muito nestes últimos dias, pela sua complexidade. Passou a figurar como um dos pontos de partida para a conclusão do meu próximo livro de poemas por ir ao encontro de outra frase, de Raul Seixas, que tem dado o tom do que tento construir: “meu corpo tem dois mil e tantos cavalos calados”.

De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, “todos os homens nascem livres”. No inciso IV do artigo 5º da Constituição Brasileira, está dito que “é livre a manifestação do pensamento”. De forma que não há dúvidas sobre a liberdade do homem de acordo com as convenções estabelecidas, a não ser por ele mesmo. Certo que a liberdade, disposta nestas afirmações, não alcança a condição natural delineada por Darwin e prosseguida por Dawkins.

Raul Seixas diz em uma de suas músicas que “todo homem tem direito de fazer o que quiser”. Ele mesmo não o fez, porque toda a sua ação foi limitada se não pelos códigos determinados pela sociedade, mas por ele próprio ante a sua condição humana ridícula e limitada.

Simone de Beauvoir disse que “o homem é livre; mas ele encontra a lei na sua própria liberdade”. Assim também pensou Jean-Jacques Rousseau quando disse que “o homem nasceu livre e por toda a parte vive acorrentado”. Para o poeta chileno Pablo Neruda, "você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências”, mesmo pensamento de Aristóteles quando afirmou que “o homem livre é senhor da sua vontade e escravo somente da sua consciência”.

O fato é que quando me ponho a discutir o conceito de liberdade não coloco aqui a rasa contenda do ir e do vir. Volto, portanto, à frase inicial desta conversa, atinando que a liberdade de que trata Jean-Paul Sartre diz respeito aos cavalos calados de Raul Seixas. O homem está condenado a ser livre não pelo seu pensamento, mas pela sua condição humana e biológica. Pela reação invisível das células que nos possuem e nos dominam, mesmo que as neguemos.

O homem tem o instinto de ser livre, por isso é condenado a tal, mas quando, segundo Nietzsche “em algum remoto recanto do universo, animais astuciosos inventaram o conhecimento”, a liberdade do homem tornou-se medo e ele aprisionou-se em si mesmo.



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